sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Dr. Lecter e a Pericardite

Há algumas semanas [mais precisamente três], uma das partes da gincana de semio era escrever uma história que envolvesse uma doença pré-escolhida pelos nossos monitores. Dentre as opções, a nossa foi Pericardite. Com os devidos créditos ao grupo Girl's Anatomy, especialmete a Rafa que tomou a frente na história e mostrou todos os seus dons artísticos, este texto foi muito elogiado pelo Prof. Carlos Eduardo e nos deu aquele up que precisávamos. Se Hollywood quiser adaptar a história, estamos aí!


Dr. Lecter e a Pericardite
Pela janela apenas a vazia escuridão assolava aquela noite gelada. O vento soprava imponente e contrastava com a suavidade de Bach enquanto Dr. Lecter apreciava a foto de sua adorada Clarice.

Já possuíra tantos corpos, já apreciara tantos sabores, mas ela era diferente. Despertava em Lecter uma estranha obsessão que confundia suas mais sólidas convicções.

Um sonho deixou-o intrigado por muito tempo, pela complexidade dos detalhes e perfeita repetição das cenas por seguidas noites.

Clarice era sua convidada em seu castelo no interior da França, onde servira Louis Corton-Charlemagne Grand Cru enquanto aguardavam o jantar. O menu, que incluía pratos franceses típicos, fora minunciosamente escolhido para uma ocasião tão especial. O sorriso dela iluminava o ambiente e embriagava Lecter mais do que qualquer vinho seria capaz de fazê-lo. Enquanto Clarice bebia, sentiu que as coisas estavam ficando estranhas e uma espécie de letargia tomava conta de seu corpo. Mal sabia ela o que lhe aguardava. Lector deixou tudo previamente preparado e cuidou pessoalmente de cada detalhe pra que nada saísse do planejado. Após o adormecimento de Clarice, causado por um forte calmante, sedou-a e levou-a para sala de cirurgia. Enquanto abria o tórax dela uma doce sensação de prazer o deixava extasiado e estimulado a continuar. Após abrir o pericárdio e expor a face do coração de Clarice, tão lindo e brilhante; pulsando ritmicamente, um sentimento de melancolia e nostalgia invadiu Lecter, remetendo-o a sua infância. Mas não poderia perder o foco, nada o abalaria quando só restava uma coisa a ser feita. Tomou o ferro flamejante em que estavam escritas suas iniciais e o eternizou no coração de sua amada.

Agora tudo estava feito, nada mais poderia separá-los. Nos dias seguintes, durante a recuperação de Clarice, Lecter sentiu que seu plano havia surtido efeito. Ela estava tão doce e apaixonada que a vida dos dois parecia tão harmoniosa e suave quanto “Air on the G String”.

Mas algo veio quebrar a cápsula de tranquilidade que envolvia o casal. Clarice subtamente sentiu uma forte dor no peito, que piorava quando procurava inspirar profundamente o ar para dentro de seus pulmões . Era algo tão intenso que mais parecia estar levando uma punhalada. Lecter tentou deitá-la na grama do jardim onde passeavam, mas quando deitava a dor piorava significativamente, deixando-o em pânico por assistir a tal cena angustiante. O único modo que atenuava um pouco a dor era quando ficava sentada e inclinada para frente.

Levou-a para dentro do castelo e acomodou-a em seu escritório. Agora, preocupadíssimo e adotando sua portura médica, Lecter pediu para que Clarice lhe contasse nos mínimos detalhes tudo o que sentira. Era a conduta mais adequada e talvez a única opção que poderia salvar a vida daquela a quem tanto estimava. Anotou em seu caderno cuidadosamente cada sinal e sintoma.

Clarice referiu uma dor intensa do tipo retroesternal que irradiava para o pescoço e costas, com frequência ventilatório-dependente, piorava com a inspiração profunda sendo do tipo perfurante. Intensificava-se pela posição supina e decúbito dorsal, diminuindo na posição genupeitoral. Já na avaliação física notou que ela estava com febre moderada que teve início repentino, sendo de longa duração. Percebeu ruídos que caracterizavam atrito correspondente aos movimento do coração. Sendo de aspecto agudo, áspero e rangente, assemelhando-se ao ranger de superfícies rugosas. Podendo ser apenas detectado quando o diafragma do estetoscópio foi apertado firmemente contra a parede torácica na borda esternal inferior esquerda.

Após muito tempo de análise Lecter excluíra a possibilidades de infarto agudo do miocárdio devido às características da dor, principalmente pelo fato de aliviar na posição genupeitoral, atitude conhecida como prece maometana. Tal fato associado ao atrito pericárdico remete Lecter ao diagnóstico de pericardite aguda.

Em uma atitude egoísta e obsessiva recusava-se a levar Clarice ao hospital. A sentença de vida ou morte de sua amada o pertencia, ninguém teria o direito de tocá-la além dele. Decide livrá-la do sofrimento que estaria por vir sedando-a e retirando de Clarice o causador de sua angústia e aflição. E para demonstrar toda sua ira, por aquele que tirou seu grande amor, crava friamente uma adaga no coração já sem pulsações porém ainda quente e de aspecto convidativo. Surge então uma vontade incontrolável e alimentada pelo ódio. Lecter prepara uma pomposa refeição na qual o prato principal já estava pré-determinado

Um comentário:

  1. Caramba! nunca mais vou confundir sinais e sintomas de pericardite. A atitude genupeitoral ficou gravada em meu cérebro. Quiçás no meu peito.
    Grato e parabéns!

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